terça-feira, 5 de agosto de 2008

Diários de Bali: primeiras impressões

No avião para Bangkok, depois de comprar um guia em Frankfurt, começo a ler e, finalmente, passo a saber algo sobre o país para onde estou indo. Estou ao lado de um casal de alemães (mais tarde, fico sabendo que os alemães são os europeus que mais vêm a Bali) bastante simpático. Não falam quase nada de inglês mas sorriem o tempo todo, consomem grande parte do arsenal de bebidas que a Thai Airways fornece e brindam quase sempre; parecem em lua-de-mel, mas seus filhos na fileira de trás e sua idade denunciam que já estão juntos há muitos anos.

Desço em Bangkok, pego o avião para Bali. Começo a pensar, entre turistas malaios e australianos, nos bombardeios de 2002 e 2005. Incrível o número de pessoas indo à ilha, sabendo que foram o alvo dos ataques terroristas: o objetivo. História colonial típica: companhias comerciais, seguidas pelo próprio governo holandês, antes dos japoneses e, finalmente, a volta dos holandeses, que não iriam largar o osso tão facilmente. Esta foi a integração dos países “não-ocidentais” (o que inclui América Latina e África) à sociedade internacional. Porém, no presente eterno em que vivemos, não há espaço mais para discutir estas coisas. A independência, a influência dos comunistas e a Guerra Fria, os anos sob Sukarno, logo os anos sob Suharto, a influência dos militares na política durante longo período, e o “bem-vindo” período democrático. Megawati, islamismo, hinduísmo, sendo o ex-general Susilo o atual presidente.

É o outro lado do mundo. Chego às 14h, horário local, 3h da manhã no Brasil. Entre conexões e horas de vôo, cerca de 30 horas de viagem. Chego no hotel, pensando em cochilar, e durmo por 8 horas, não sei se por causa do cansaço da viagem ou porque eu estaria dormindo no Brasil, embora aqui fosse o meio da tarde. É o outro lado do mundo.

E, ainda assim, é outro mundo. Come-se nodles (come-se nodles em todas as refeições) e batatas no café-da-manhã, tofu, carnes em geral. O vestuário é todo colorido, até mesmo em ambientes mais formais, como no caso da conferência de que participei. Aliás, tudo aqui é mais colorido, mais vivo: a arte, as roupas, os objetos. Observo que o bigode, ao contrário do Brasil, é muito comum por estas bandas. Badmington é, ainda não consigo acreditar, o esporte mais popular do país. Badmington? Really?, eu pergunto. Badmington?

O trânsito é um capítulo a parte. Há mais motos e mototáxis do que a média brasileira. Detalhe: metade deles sem capacete. Outro detalhe: crianças dirigem grande parte das motos. Crianças são colocadas em motos com os pais e, se algum deles está sem capacete, são sempre os filhos. Em Bali é comum ver cigarros de Bali, que me fizeram começar a fumar, e ainda não há a perseguição ao tabaco que se costuma perceber na maioria dos países “ocidentais”: pode-se fumar em praticamente todo lugar. O trânsito é caótico, eu não teria a mínima condição de dirigir por aqui, por mais imprudente que alguns me considerem. Dirige-se do lado esquerdo, como os ingleses, e a buzina é onipresente. Dentro de um táxi, observo o motorista utilizando a buzina de 15 em 15 segundos, e não consigo compreender para quê, para quem está buzinando. Parece um hábito, algo mecânico, embora eu saiba que é algo que me escapa. E qualquer pessoa pode entrar no meio da rua e parar o trânsito, sem grandes reclamações dos motoristas. É o que fazem os funcionários dos hotéis, para chamar táxis ou permitir a saída de algum veículo, ou até mesmo para permitir que os turistas consigam atravessar a rua. Aliás, as ruas são muito estreitas e as calçadas, mais ainda.

Grande parte da minha vida social com os nativos ocorreu dentro de carros, em conversas com os motoristas e guias. O sotaque em inglês é muito diferente daqueles aos quais eu tinha me habituado, e é comum eu pedir para que repitam a frase para que eu consiga entender. Todos trabalham muito (é impressionante o número de estabelecimentos que ficam abertos até tarde da noite, senão 24h) e, não obstante, parecem sempre estar de bom humor. São orientais de pele morena, e tendem a ser mais baixos do que eu. Outro susto: ao tirar foto para minha credencial, a funcionária da conferência, ao ver que teria que ajeitar a câmera, disse-me, com um ar sério, que eu era “alto demais”. Eu quase agradeci o elogio!

O governo não parece ser tão presente na vida das pessoas de Bali. Poucas vezes vejo funcionários governamentais, incluindo a polícia, ou estabelecimentos públicos. A economia, aqui, é toda voltada para o turismo, que representa cerca de 70% da renda local. Assim, quase todas as placas são escritas em inglês, e praticamente todo mundo consegue estabelecer uma conversa, ainda que simples, nesta língua. Assim, todos tentam fazer sua parte para facilitar a vida dos turistas. Há muitas casas de câmbio (não sei se autorizadas; algumas têm escrito “authorized money changer”. Isso quer dizer que as outras não são?), hotéis, spas, caixas automáticos, feiras, vendedores ambulantes, restaurantes para todos os gostos. Os bombardeios foram uma péssima notícia para todo mundo: o movimento turístico é cerca de metade do que era até outubro de 2002. Muita gente, na ocasião, perdeu o emprego, muitos estabelecimentos faliram. Ouvi muitas histórias desse tipo em minhas conversas. Mais uma vez, os estabelecimentos privados fazem sua parte: todos os carros que entram em hotéis têm os porta-malas revistados e um detector é passado na parte de baixo de cada um deles. Em outras palavras, ainda pode-se respirar os ataques por aqui. Os mais jovens brincavam com palavras como “fuck terrorists”. Cheguei a ver camisetas a venda com estes escritos. Um turista ocidental mais inteligente não usaria estas camisetas: poderia parecer arrogância, provocação e, dependendo, até mesmo uma ofensa direta. Mas eu não acredito na inteligência dos turistas.