quarta-feira, 12 de dezembro de 2007
Noturno n.º 9
terça-feira, 4 de dezembro de 2007
Ócio criativo
medianamente.
Novamente.
E toda vez que leio
É sempre a impressão
de que meu texto,
não sei a que veio.
Pensamento que,
levianamente,
não mente.
O que escrevo, sei,
é besteira.
Coisas sem eira
nem beira.
quinta-feira, 8 de novembro de 2007
Invisível
Eu sou o vento, não tenho rumo definido: meu destino é lugar nenhum. A liberdade é transparente. Sinto o corpo das pessoas em quem toco, e algo delas fica
Deixo nelas um sentimento, uma sensação, um pensamento. Elas sentem que ganharam algo. Algo há de carnal no vento, há algo sensual
quarta-feira, 24 de outubro de 2007
Viagens, Alain de Botton, Paloma, Fernando Pessoa
Não: não quero nada.
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.
Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafisica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) ¬
Das ciências, das artes, da civilização moderna!
Que mal fiz eu aos deuses todos?
Se têm a verdade, guardem-na!
Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?
Não me macem, por amor de Deus!
Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?
Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja de companhia!
Ó céu azul o mesmo da minha infância¬,
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.
Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo …
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio, quero estar sozinho!
sexta-feira, 5 de outubro de 2007
Pé rachado
Meu avô, também goiano
O meu bisavô, goiano
Meu tataravô, goiano
Meu maestro soberano
é - entrego - outro goiano.
quarta-feira, 26 de setembro de 2007
Súbito
Melhor: é um momento.
A fantasia
(num momento!)
expira.
Você, aí,
(nesse exato momento)
é livre.
quarta-feira, 19 de setembro de 2007
Preconceito de classe média
Suponhamos que você nasça num barraco, com pai desconhecido e mãe adolescente, na periferia de uma grande cidade. Suponhamos que você consiga sobreviver, de alguma maneira, apesar das milhões de doenças que causam o ainda alto índice de mortalidade infantil do Brasil. Suponhamos, então, que você não possa estudar, porque tem de ajudar a família a catar lixo para vender para reciclagem. Suponhamos que, milagrosamente, você não seja cooptado pelo tráfico nem consuma drogas. Suponhamos que sua família perca o barraco numa ação judicial a favor dos verdadeiros proprietários da terra, que a compraram anos antes. Suponhamos que façam uma fábrica lá. Você não consegue trabalhar na fábrica, porque não tem educação formal. Suponhamos que sua mãe morra cedo. Suponhamos que você vá pra debaixo da ponte e morra assassinado. Suponhamos que ninguém note, não saia nos jornais, porque ninguém liga para morte de pobre.
Suponhamos, agora, que você nasça num bairro de classe média. Que seus pais tenham condições de te sustentar para você não precisar trabalhar. Suponhamos que, então, você passe numa universidade pública gratuita, paga por impostos de todos. Ou não passe e pague caro por uma particular. Suponhamos que continue sem trabalhar, porque não precisa, e continue estudando. Depois de anos, suponhamos que consiga um emprego bom e forneça o mesmo padrão de vida a seus filhos.
Agora, suponhamos que as pessoas da situação 2 culpem as pessoas da situação 1, a grande maioria da população, por sua miséria. E que digam, inclusive, que eles não têm nada porque não trabalham. Suponhamos que as pessoas da situação 2 achem que as pessoas da situação 1 sejam aproveitadores que pretendem roubar o fruto de seu suado trabalho. Imagine que porcaria de país seria esse.
Bem-vindo ao Brasil.
terça-feira, 4 de setembro de 2007
Eu é você
Numa idealização profunda da outra, que ainda mantenho (sumiu), foi difícil entrever o que havia (há) de humano em nós. Mas o amor, ele nos mudou, e nos abraçou, a nós, que pensávamos abraçar somente um ao outro. E era esse nosso amor ao nosso amor que nos fez ver uma vida diversa, que imaginávamos jamais possível. E foi nessa aventura que eu, afinal, me tornei algo que jamais pensara ser. Por causa de você, das fantasias que você me vestiu, e que eu tanto procurei merecê-las. Algumas daquelas fantasias ficaram. Outras, muitas outras, não couberam no limitado demasiado humano que eu era (sou).
No momento em que nos descobrimos nus, nus para além do momento do êxtase e dos nossos corpos mesclados e cansados, era como se o mundo inteiro estivesse apontando aquela frágil exposta nudez. Nossas fantasias foram sub-repticiamente retiradas num momento em que eu não esperava. E foi então que as lágrimas dificultaram mesmo a visão do breu em que eu nunca soubera estar.
Mas a você agradeço, por ter recebido e me dado tanto amor. Um amor que moveu mais a vida do que quaisquer outros sentimentos que passaram por mim nesses tantos anos. Eu agradeço a você por me dar o que eu sou e o mundo que tenho. E agradeço a você, também, porque, ainda (não mais) te amando, quero ainda vestir as mais inefáveis fantasias que experimentei até pouco antes de você ir-se para sempre.
Não vou negar o amor que tenho (tive). Pois negar o amor que tenho (tive) por você, seria negar que eu sou eu. Eu é você. E o que há de mudança em mim, inclusive nos meus tantos esforços para mudar o meu jeito de amar de ver de sentir, é ainda vestígio do amor que permaneceu (acabou) e que lhe busca nos mais longínquos espaços, longe dos meus olhos e da minha idéia, mas jamais longe do coração. E é isso que me resta (restou).
Mont Sion
Estava num bar, ouvindo a Karen, e súbito tive uma revelação. É preciso ouvir a Karen com atenção, pois a fala kareniana é complexa. Ela diz que não acredita numa história de um pescador, e defende-a contra todos os ataques boêmios que contra ela se levantam. Ela diz sempre que não é ongueira, e fala a favor das ONGs que menciona, e outras que não conhece. É preciso compreender a Karen, e eu sou lento para entender as pessoas, ainda mais a Karen.
Pois bem, a Karen estava falando de um tempo em que estava abalada. E como ando ouvindo tanto falar de etimologia como verdade, comecei a pensar na origem da palavra, e foi quando surgiu a revelação: a, do grego, significa negação, ausência; balada, do francês ballade, deu origem ao termo que designa os seres humanos se jogando incessantemente em festas, orgias, esbórnias, sempre com muita música dançante. Abalada é pessoa sem balada. E não há como não pensar assim. Viu que é preciso muita perspicácia com a Karen.
A Karen, tadinha, ficou um tempo sem balada. Mas esse tempo já passou. Eu estava num bar, ouvindo a Karen. A Karen anda numa balada sem fim. A Karen, para falar bem a verdade, está hiper-badalada.
domingo, 26 de agosto de 2007
Cabaret Kalesa
eu pergunto:
Você tem fogo?
Ela responde:
Lógico.
Meio da festa,
ela passa:
Você ainda tem fogo?
Ela me olha:
Sempre!
Ela é carioca.
sexta-feira, 27 de julho de 2007
Mais citações
"We all want to be told stories, and we listen to them in the same way we did when we were young. We imagine the real story inside the words, and to do this we substitute ourselves for the person in the story, pretending that we can understand him because we understand ourselves. This is a deception. We exist for ourselves, perhaps, and at times we even have a glimmer of who we are, but in the end we can never be sure, and as our lives go on, we become more and more aware of our own incoherence. No one can cross the boundary into another – for the simple reason that no one can gain access to himself".
(Paul Auster, em "The New York Trilogy")
Numa noite parisiense...
Quand tu aimes il faut partir
Quitte ta femme quitte ton enfant
Quitte ton ami quitte ton amie
Quitte ton amante quitte ton amant
Quand tu aimes il faut partir
Le monde est plein de nègres et de négresses
Des femmes des hommes des hommes des femmes
Regarde les beaux magasins
Ce fiacre cet homme cette femme ce fiacre
Et toutes les belles marchandises
II y a l'air il y a le vent
Les montagnes l'eau le ciel la terre
Les enfants les animaux
Les plantes et le charbon de terre
Apprends à vendre à acheter à revendre
Donne prends donne prends
Quand tu aimes il faut savoir
Chanter courir manger boire
Siffler
Et apprendre à travailler
Quand tu aimes il faut partir
Ne larmoie pas en souriant
Ne te niche pas entre deux seins
Respire marche pars va-t'en
Je prends mon bain et je regarde
Je vois la bouche que je connais
La main la jambe l'œil
Je prends mon bain et je regarde
Le monde entier est toujours là
La vie pleine de choses surprenantes
Je sors de la pharmacie
Je descends juste de la bascule
Je pèse mes 80 kilos
Je t'aime
(Blaise Cendrars)
segunda-feira, 23 de julho de 2007
"Minha filhinha querida,
Você foi de um egoísmo monstruoso. Acho que é em parte culpa minha que você tenha se tornado o que é. Gostaria de não te amar, mas, das duas filhas que nós tivemos, sua mãe e eu, você era a mais linda. E você precisava me seduzir. E eu preciso ser seduzido. Eu estava muito só, sua mãe vivia no hospital, e isso facilitou as coisas pra você.
Amei você loucamente todos esses anos. Sua irmã se fechou e, você, você desabrochou. Cada dia mais agressiva, mais insolente, acre, fria, superficial. Mas não pude evitar de amar você. Agora, sinto um ódio por você que não some nem estando meu corpo
Sou culpado, pois fui eu que tornei minha filhinha arrogante. Eu realmente amei o seu orgulho. Como a coalhada, sua arrogância virou uma vaidade azeda. Seu orgulho tornou-se uma afetação estúpida. Hoje, você é uma pessoa amarga. É mesmo minha filha. Por trás do seu riso seco, acha que não vejo como se diverte? Diverte-se, porque o orgulho te enfraquece, mas sua amargura lhe dá uma força terrível. Você era toda submissa. Até que descobri, por trás de sua submissão, uma vontade e uma inveja que me encheram de terror.
Tenho medo de você. Odeio você, minha filhinha. Estou morrendo, e acho injusto que eu morra e que você viva. Queria que você tivesse o meu câncer, que sofresse. Ter tempo de perdoar você após a sua morte. Então, morro cheio de ódio. Não suporto que você sobreviva a mim. Eu queria que você morresse no meu lugar, e isso não é possível.
Ma petite fille cherie,
Tu étais d’un egoïsme monstrueux. Je pense que c’était un peu de ma faute si tu es devenue ce que tu es. Je voudrais ne pas t’aimer. Mais des deux filles que nous avons eues, ta mère et moi, tu étais la plus jolie. Et tu avais besoin de me séduire. Et j’ai besoin d’être séduit. J’étais très seul, ta mère était souvent à l’hôpital, et cela t’est rendu la partie facile.
Je t’ai follement aimé, toutes ces années. Ta soeur s’est renfermé, et toi, tu t’es epanouie. Chaque jour plus agressive, plus insolente, âcre, froide, superficiel. Mais je n’ai pu m’empêcher de te chérir. Maintenant, j’ai une colère contre toi que je n’arrive pas à arrêter alor que mon corps est devasté. Je brûle de colére, en avant ta rébellion mauvaise.
Je suis coupable, parce que c’est moi qui a poussé ma petite fille à ètre fière. J’avais tellement aimé ton orgueil. Comme le caillé, ta fierté a tourné une vanité aigre. Ton orgueil est devenu une coqueterie stupide. Aujourd’hui, tu es une autre d’une amertume, mon enfant, comme moi. Tu es bien ma fille. Derriére ton rire sec, crois-tu que je n’entends pas comme tu jouis? Tu jouis parce que l’orgueil t’enfaible mais ta amertume te donne une force terrible. Toi, tu étais toute soumise. Mais que je decouvre, derrière ta soumission, une volonté et une envie qui me plonge dans la terreur.
Je te crains. Je te hais, ma petite fille. Je suis en train de mourir et j’estime injuste que je meure et que, toi, tu vives. Je voudrais que tu aie mon cancer et que tu soufres. Avoir du temps pour te pardonner après ta mort. Alors, je meurs dans la colère. Je ne supporte pas que tu me survives. Je voudrais que tu meures en ma place, et ce n’est pas possible.
(do filme « Reis e Rainhas », de Arnaud Desplechin)
terça-feira, 10 de julho de 2007
A propósito de meu aniversário. A propósito do livro que estou lendo no meu aniversário.
Yes, it is possible that we do not grow up, that even as we grow old, we remain the children we always were. We remember ourselves as we were then, and we feel ourselves to be the same. We made ourselves into what we are now then, and we remain what we were, in spite of the years. We do not change for ourselves. Time makes us grow old, but we do not change.
(Paul Auster, The invention of solitude, p. 145).
segunda-feira, 9 de julho de 2007
Identidade na obra de Bernardo Carvalho
domingo, 1 de julho de 2007
On Paul Auster: "City of Glass"
sexta-feira, 29 de junho de 2007
Abrindo o balcão
Quantos blogs não há por aí, com os escritos mais ridículos e sem interesse. Para quê ser mais um nesse universo? Para que escrever algo que ninguém lerá?
É para descobrir que o estou abrindo.